Pesquisadores fazem registro raro e descobrem nova espécie de cobra da Mata Atlântica
A identificação de novas espécies na Mata Atlântica, densamente povoada e explorada há séculos, sempre causa algum nível de surpresa. O novo registro pro bioma é uma cobra, que apesar de batizada de Dipsas bothropoides pela sua semelhança com as jararacas (gênero Bothrops, da família de víboras), não é peçonhenta e pertence ao grupo das serpentes conhecidas popularmente como dormideira. A descoberta deu trabalho aos pesquisadores, que encontraram apenas um outro exemplar da espécie. A escassez de registros levou os biólogos a apontarem que ela pode ser considerada criticamente ameaçada de extinção.
O primeiro encontro com a Dipsas bothropoides foi feito pelo herpetólogo Konrad Mebert em 2016, que passou por um exemplar recém-morto na estrada, no município de Itacaré, no litoral da Bahia. Ao ver a serpente, Konrad percebeu que aquela não era nenhuma das espécies já conhecidas na região. Durante as investigações para identificar a cobra, foi encontrado outro espécime, coletado em Minas Gerais em 2004 e que fazia parte da coleção do Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ambas as coletas correspondem a ambientes de Mata Atlântica.
A identificação da Dipsas bothropoides foi publicada no início de agosto, no South American Journal of Herpetology. O artigo é assinado por uma equipe de pesquisadores. Além de Konrad Mebert, da Universidade Estadual de Santa Cruz, da Bahia, participaram da pesquisa herpetólogos do Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade Federal do Rio Grande.
O gênero Dipsas possui 41 espécies distribuídas do sul do México pela América Central até a América do Sul. São cobras de pequeno e médio porte com estilo de vida arborícola e com alimentação especializada em caracóis e lesmas. O padrão de cor é altamente polimórfico, mas a maioria das espécies de Dipsas exibe manchas ou anéis escuros em uma cor de fundo marrom claro a cinza.
“A descoberta e o reconhecimento de Dipsas bothropoides como uma nova espécie baseada em apenas dois espécimes encontrados em uma área aparentemente bem amostrada, qualifica-a como uma espécie muito rara”, explica o artigo que esclarece que a suspeita de que poderiam se tratar de dois indivíduos de uma espécie já conhecida, porém com anomalias, foi descartada por causa do grande número de diferenças entre essas duas Dipsas e outras espécies próximas. “Uma mutação genética produziria formas aberrantes em apenas um grupo particular de caracteres externos (ou seja, mutações separadas para cor, tipo de mancha ou número de escala), como geralmente acontece em espécimes aberrantes”, justifica o estudo.
Os pesquisadores destacam ainda que a Mata Atlântica é um hotspot de conservação com menos de 10% da sua cobertura original remanescente, que se encontra na maior parte fragmentado e perturbado. “Cobras arbóreas, como a nova espécie Dipsas bothropoides, estão provavelmente em risco de extinção devido à perturbação e perda rápida de seu habitat. Esta espécie pode persistir apenas em baixas densidades. Portanto, e como atualmente conhecemos D. bothropoides apenas a partir de registros únicos em duas localidades, consideramos esta espécie em Criticamente Ameaçada”, alertam no texto.